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27/10/2021 às 16h21min - Atualizada em 27/10/2021 às 16h21min

Entenda as mensagens ecológicas de Duna, clássico do sci-fi que chega aos cinemas

Obra de Frank Herbert ganha nova vida nas telonas após 56 anos, mas com discussões ambientais mais atuais do que nunca

Lidia Zuincolaboração para a CNN
https://www.cnnbrasil.com.br
Cartaz de Duna, de Denis Villeneuve: obra original de Frank Herbert era dedicada aos ecologistas e o diretor da nova versão leva isso às telas Divulgação

Em um planeta desértico chamado Arrakis, a família Atreides chega para extrair uma rara especiaria chamada Mélange, usada em viagens interestelares. Falta de água, condições ambientais extremas e intrigas políticas fazem parte dos cenários de “Duna”, livro clássico da ficção científica, que ganha uma nova versão nos cinemas.

Publicado em 1965, o romance de Frank Herbert completa 56 anos e ganha uma nova vida nas telonas pelas mãos do canadense Denis Villeneuve, queridinho de Hollywood que já trabalhou com outras grandes ficções científicas, como “Blade Runner 2049” e “A Chegada”.

A versão anterior de “Duna”, de David Lynch, lançada em 1984, não trazia o mesmo clima inóspito que vemos no novo filme. Villeneuve usa sua adaptação para trazer à tona os elementos ecológicos da obra de Herbert através da fotografia — e as reforça em declarações públicas.

Timothée Chalamet interpreta Paul Atreides (à direita), cuja família extrai, no planeta desértico Arrakis, uma rara especiaria chamada Mélange, usada em viagens interestelares

A vida em um planeta inóspito é um desafio à sobrevivência humana

O diretor canadense Denis Villeneuve adaptou o livro "Duna", do norte-americano Frank Herbert, um clássico da ficção científica publicado em 1965

Através da fotografia do filme, Villeneuve traz à tona os elementos da temática ambiental da obra de Herbert

Villeneuve tem declarado sua preocupação com as mudanças climáticas e reforçado a relação da obra de Herbert com as questões ambientais

Na trama, o médico Yueh espiona a família Atreides a mando do Barão Harkonnen, que governa sadicamente os nativos de Arrakis

A nova versão cinematográfica de Duna se centra em uma espécie de profecia focada no personagem Paul Atreides

Em meio à crise climática da Terra, o livro e o filme dialogam com a realidade atual e com as causas ambientalistas

Durante o Venice Film Festival, o diretor não só manifestou preocupação com as mudanças climáticas, como também afirmou que seu novo filme leva essa mensagem ao público: “Quando Frank Herbert escreveu ‘Duna’ nos anos 1960, na época, era um retrato do século 20, mas acho que cada vez mais a obra se tornou uma previsão do que irá acontecer no século 21 e, infelizmente, o livro é muito mais relevante hoje em dia.”

De acordo com Bruno Birth, diretor do podcast DunaCast, Herbert antes mesmo de ser escritor já era bastante ligado às questões ambientais. Nascido em Tacoma, nos Estados Unidos, sua infância se deu em uma das várias comunas ecológicas e socialistas da década de 1920. “Duna foi originalmente pensado como um romance de ficção científica focado em ecologia, tanto que no prefácio escrito por Herbert, ele dedica a obra aos ecologistas”, comenta.

Villeneuve, por sua vez, deixa essa intenção evidente no longa. Para Adriana Amaral, doutora em comunicação social e professora da UNISINOS, está “muito clara a crítica racial, colonial e ambiental, bem como o gênero da climate fiction (ficção climática)” na obra do diretor canadense.

Também conhecido como cli-fi, o subgênero da ficção climática aparece atualmente no trabalho de autores como Jeff VanderMeer e Kim Stanley Robinson, sendo que o último lançou, em 2020, o livro “The Ministry for the Future”, no qual, inclusive, oferece propostas práticas de ativismo.

Obras como estas são extremamente importantes como alertas sobre possíveis futuros. Essa é a perspectiva de Bibiana Haygert, autora da newsletter Clímax e mentora de cursos sobre sensibilização climática. A pesquisadora acredita que a ficção, e principalmente o cinema, podem ajudar a tornar temas difíceis mais palatáveis para todo o tipo de público, justamente por ser um formato mais envolvente e estimulante.

No caso da ficção científica, há ainda mais potencial de levar a audiência para realidades que hoje parecem impossíveis. “Isso é muito interessante para falar da questão climática, pois quando a gente está só vivendo o dia após dia, é muito difícil notar as mudanças acontecendo”, comenta Bibiana. “Mais que isso, o que leva muitos a não quererem saber do assunto é a dificuldade em sairmos desta crise, como controlamos a mudança climática e evitamos seus maiores impactos. Para muitos, a própria sobrevivência já parece impossível em um futuro próximo.”

Isso fica exemplarmente claro na obra de Herbert quando conhecemos o trabalho do pai do personagem Liet-Kynes, o primeiro ecologista do planeta Arrakis e criador de um plano de terraformação — isto é, um processo de engenharia ambiental capaz de modificar a atmosfera, temperatura, topografia superficial ou ecologia de um planeta, lua ou outros ambientes de modo a ficarem mais próximos do ecossistema terrestre.

Bruno Birth comenta que o próprio império do universo de Duna já tem uma estratégia colonizadora ao explorar os planetas de seu sistema, mas, no caso de Arrakis, descobriu-se que era mais interessante economicamente mantê-lo desértico, uma vez que a especiaria Mélange, encontrada nas areias, se tornou um ativo tecnológico, político e econômico de grande importância.

Enquanto pesquisadora de cultura de fãs, Adriana acredita que o novo Duna pode mobilizar públicos para lutarem por questões ambientais. Esse é um fenômeno que tem ocorrido, por exemplo, na base de fãs de K-Pop (música pop coreana), que passou a ter um maior ativismo às causas relacionadas à Amazônia depois de uma campanha feita pelo grupo BTS. “Acredito que isso vai pegar forte no fandom e o pessoal que pesquisa ativismo já tem dados sobre isso”, adiciona.

Afinal, o que se tem observado é que assim como outros subgêneros da ficção científica como cyberpunk ultrapassam a ficção para se tornarem movimentos políticos, também há algo semelhante acontecendo no caso do Solarpunk, que propõe futuros sustentáveis a partir da tecnologia.

Bibiana acredita que é, justamente, esse tipo de abordagem mais propositiva do Solarpunk e também do livro “The Ministry for the Future”, de Robinson, que estamos mais precisando. “A gente ouve muito aquela frase ‘é mais fácil imaginar o fim do mundo do que o fim do capitalismo’ e não é culpa só do capitalismo. Nós, humanos, temos uma facilidade imensa de imaginar os piores cenários possíveis,” ela comenta. “Narrativas apocalípticas sempre existiram. Agora, imaginar como sair do problema e a possibilidade de um futuro melhor parece cada vez mais difícil.”

O fato de Duna se centrar, justamente, em uma espécie de profecia focada no personagem Paul Atreides traz tanto essa base de fé quanto um elemento estratégico. Afinal, como também exposto no filme de Villeneuve, Arrakis era para ser um paraíso se o plano de terraformação tivesse sido seguido.

É nesse ponto que Julia Brazolim, designer e divulgadora de astronomia no projeto Missão Exoplaneta, vê conexões entre a ficção e a realidade: “Duna nos faz refletir sobre como recursos naturais são explorados, como é com o petróleo, e até onde vai sua exploração. Aborda também o fato de que há escassez de água e que as crises hídrica e climática vêm impactando cada vez mais junto às crises políticas intensas entre países que querem obter petróleo.”

Junto ao messianismo, Duna também traz estratégias factíveis e tecnológicas para se pensar na sobrevivência em ambientes inóspitos. É interessante notar, por exemplo, que o próprio projeto de terraformação não exclui os famosos “vermes” de 900 metros de comprimento, os quais são, justamente, responsáveis por produzir especiaria e oxigênio no planeta Arrakis. Isto é, o plano de terraformação nunca teve uma intenção predatória de supremacia humana, mas sim de ser um sistema que buscasse equilíbrio ambiental.

Para isso, todo recurso é importante. A umidade, mais do que a água, é extremamente valiosa no universo de Duna, como Villeneuve mostra em uma cena na qual se explica que cada palmeira plantada consome água suficiente para hidratar dezenas de pessoas. Cumprimentos e votos de confiança são feitos não no fio do bigode, como antigamente, mas sim com a umidade da saliva e mesmo os cadáveres são processados para retirada de água. Para sobreviver ao deserto, os nativos de Arrakis, conhecidos como Fremen, usam as chamadas “stillsuits”, que são roupas isolantes  e que permitem a reciclagem das excrescências de modo a otimizar os recursos ao máximo.

Assim, Duna pode ser definida conforme sugere o biólogo e professor Alex Oliveira: uma obra atemporal na qual já existia uma série de discussões e preocupações ecológicas que reverberam mais do que nunca na contemporaneidade. “É uma obra épica que fala sobre a preservação ambiental, o que a torna uma obra atual e necessária de ser lida e refletida sob o enfoque ecológico e que faz paralelo com a urgência do presente”, conclui.

 


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